Na
quinta-feira (20) Natal teve uma das maiores manifestações populares da sua
história recente. Um mar de jovens, especialmente jovens, inundou a BR-101 e
expôs as entranhas de um sistema político anacrônico, que há muito deixou de
estar em sintonia com o desenvolvimento da democracia, mas que permanece
presente graças a uma série de elementos que ainda não foram superados.
Natal em 20 de junho : milhares na BR-101. |
Banho
de democracia? Certamente que a democracia brasileira, que tem apenas 28 anos,
foi sacudida por milhares que foram as ruas do Brasil e pelos pouco mais de 20
mil que se espalharam pela BR-101, numa miríade de cores e interesses. É de se
lamentar que a retirada dos ônibus, estratégia dos empresários com o
beneplácito do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado
do RN (SINTRO-RN), tenha desestimulado, quero crer, a participação de milhares
de trabalhadores que poderiam ter engrossado essa manifestação. Mas isso é mera
suposição.
BR-101 em Natal : a maioria era de jovens. |
Acompanhando
uma tendência vista nas últimas manifestações, emergiu um grito “apartidário”,
violento e truculento, estranho a manifestações que seriam “democráticas”,
animado pelo sentimento, justo, de indignidade contra um sistema que eles mesmos
sustentam, ou pelo menos sustentavam até semanas atrás, via apatia política e o
voto sem critério algum.
As bandeiras dos partidos foram hostilizadas. |
A
moçada, movida pela adrenalina e animada pelos sussurros e gemidos vindos da
obscuridade fascista, puseram em ação a truculência anti-democrática via gritos
de liberdade e democracia.
Democracia....democracia? |
Protesto
que, se num primeiro momento foi considerado “baderna” pela mídia, como num
passe de mágica, passou a ser “manifestação” e a “baderna” passou a ser
reverenciada como um “muda Brasil”, talvez numa referência ao “Fora Collor”. A
crise de representação, que se arrasta desde a década de 90, agora foi exposta
à sociedade e a face dessa crise é feia.
A
alegria, mesclada com indignação, sem líderes ou liderados, agrada à imagem de
quem defende a liberdade do indivíduo, aquele que não responde a ninguém senão
a ele mesmo. Não é toa que a postura anarquista voltou a ser vista, por essa
massa, como algo atrativo, embora seja uma espécie de “anarquismo soft”, sem
referência aos postulados anarquistas e muito mais movido pelo rechaço ao
modelo vigente.
Manifestações
em todo o Brasil, e especificamente aqui, com várias bandeiras, vários
questionamentos e enfurecida pelo anacronismo do sistema de representação
política, por um Judiciário corporativo e por uma camada dirigente que, em boa
medida, assenhorou-se do aparelho do estado para se auto-reproduzir, fez essa
massa literalmente “surtar”. E pequenos grupos, nada desorganizados,
aproveitaram esse momento para apresentar seu propósito : a destruição pela destruição,
como que para ser um grito de revolta e não apenas de protesto.
Vários
pequenos movimentos, sendo o mais expressivo deles o #Revolta do Busão,
mergulharam no processo, reverenciando o espírito apartidário e realçando a
face democrática via “coletivos”, como se isso não fosse uma forma de
organização. A máscara do Anonymus provou que a não-face, que expressa um
sentido do “eu sozinho”, também carrega a semente do niilismo que não se sabe
bem para onde vai.
Mas manifestações
foram infiltradas por provocadores que realizaram atos violentos e assumiram
bandeiras políticas reacionárias, mirando não nos governadores e prefeitos, e
muito menos nas câmaras, assembleias ou o próprio parlamento. O alvo,
claramente passou a ser a presidente Dilma Roussef, e isso ficou claro nas
intervenções dos articulistas reacionários da Veja, o esgoto midiático que se
apresenta como revista.
A transformação da luta democrática e social
em um cenário de caos e desordem é o “sonho de consumo” forças da direita
golpista, que se antes pareciam um delírio esquerdista, agora o que se vê é o
seu assanhamento.
Resta saber até onde
essas manifestações irão. E também como a esquerda vai se comportar diante
dessa situação.
Pandora está se
abrindo.
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