Nesta terça (17) o Brasil, esse
gigante preguiçoso e adormecido, roncou. Não despertou como os mais ufanistas
gostariam, já que o ronco parece não ter incomodado a vastíssima legião de
"politicanalhas" espalhados país afora e cujo poder, de fato, encontra-se nas mãos
de uma cadeia complexa de articulações políticas, que vão desde a União até o
menor município da federação. Mas roncou alto. Um ronco que, segundo cifras mais
otimistas, mobilizou mais de 200 mil pessoas em pelo menos dez capitais. Foi um
ronco gigante.
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Manifestação em Brasília : as ruas fizeram o Gigante roncar? |
O ronco retumbante, que alguns esperam
virar brado, não tem face, nem ideologia, mas tem discurso. Seu discurso é a da
insatisfação contra os governos estaduais e municipais, que construíram uma
convivência promíscua com os oligopólios que controlam os transportes públicos.
Esse foi o motivo que fez detonar o processo de manifestação. Mas não é só
isso.
As manifestações mostraram que a
sociedade, mesmo desorganizada, é capaz de, em momentos específicos, estabelecer
uma espécie de catarse coletiva, apoiadas nas redes sociais, que funcionaram
como uma caixa de ressonância, estabelecendo um “espírito coletivo” basicamente
entre os jovens. Das manifestações saíram gritos contra os gastos da copa, do
sempre estado caótico da saúde pública, da eterna ausência de recursos para a
educação, etc.
Duramente reprimidas pelas polícias
locais e fulminadas pela mídia, cujo repertório de ilações ia de “baderneiros”
ao extremo de “terroristas”, as manifestações conseguiram neutralizar a campanha
difamatória do PIG (Partido da Imprensa Golpista) e em menos de uma semana
voltaram à condição de “manifestantes”. Tudo, é claro, com a tentativa de
transformarem essas manifestações em algo “ordeiro” e “pacífico”, como numa
procissão de monges em voto de silêncio. Tudo ilusão, já que as manifestações
podem até ter um certo controle no começo, mas nunca se pode dizer exatamente
como terminarão.
Dessa vez, e sob ordens, a PM de São
Paulo, governada por um tucano, fez o que se deve fazer. Acompanhou o movimento
e garantiu o direito de manifestação, inerente às democracias, avançadas ou
não. No incidente mais violento um manifestante de 16 anos, em Maceió, levou um
tiro no rosto, deferido por um animal que dirigia o seu veículo e tentou furar
o bloqueio feito pelos estudantes.
Em Brasília, manifestantes quase
invadiram o Congresso Nacional, mas, com negociação, acabaram recuando e se
dispersando. Apenas no Rio, onde meia-dúzia de elementos, equivalente a 0,5% do
total de manifestantes que enfeitaram as ruas cariocas, resolveram dar vazão às
suas adrenalinas atacando o pequeno contingente de policiais que guardava a
Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. As “forças repressoras burguesas”, em
minoria, prontamente se refugiaram no prédio. E em Porto Alegre em que um
grupelho de manifestantes resolveu digladiar-se com as tropas da PM local, os
brigadistas, para extravasar seus instintos “ninjas”. Afora esses pequenos
incidentes, as manifestações foram tranquilas e representativas. Tinha de tudo.
A oposição parlamentar, logo veio aos
microfones, externar uma espécie de “apoio”, com o líder do DEM, José Agripino
Maia, vociferando impropérios e apoiando as manifestações. Talvez o senador
imagine que as pessoas mais informadas, desconheçam sua trajetória no governo e
na oposição, e o tomem com um “grande democrata-revolucionário”,
Já o tucano Álvaro Dias (PSDB/PR),
famoso pelo ódio ao Governo, disse que “está em marcha um movimento pela
mudança” e que o modelo de gestão implantado pelo PT, nesses dez anos de
governo, compromete a qualidade dos serviços públicos, como educação, saúde e
segurança. Parece uma piada, mas a oposição, derrotada e enfraquecida, se
agarra ao que estiver à mão, para se reposicionar em 2014.
As esquerdas estão meio que atônitas,
olhando para esse movimento com os olhos da simpatia de quem nasceu dentro de
processos reivindicatórios, mas meio que envergonhados por não estarem à frente
desse processo. Estão colocando as barbas de molho e devem, ou deveriam já
pensar em estratégias para enfrentarem as questões colocadas por estas
manifestações, e evitar o retrocesso que seria um governo neoliberal, expresso
na aliança PSDB-DEM, recuperar a pauta de FHC em nome do novo.
O que os organizadores dos movimentos
torcem é para que as manifestações ganhem cada vez mais fôlego, e nisso recebem
o apoio de alguns grupúsculos neo-fascistas que, com discursos pseudo-esquerdistas,
tentam utilizar o justo processo como uma alavanca para suas organizações
fantasmagóricas e truculentas, que vivem marginalizadas pelo voto e esperam
encontrar a “redenção revolucionária” no seio das massas.
As consequências desta terça podem ser
positivas, se empurrarem o governo, hoje prisioneiro do fisiologismo
escancarado do PMDB, de volta às massas populares, contribuindo para o (re)fortalecimento
dos movimentos sociais, ou negativas, se a pauta for devidamente absorvida pelo
discurso das oposições conservadores no processo eleitoral de 2014.
As próximas semanas revelarão até onde
esse processo fará com que o Gigante ronque mais alto. Aqui em Natal ocorrerá
mais uma manifestação nesta quinta-feira (20) e veremos se permaneceremos nesse
sono letárgico de um estado dominado pelos clãs, ou se o ronco do gigante nos
despertou.
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