Enquanto
nas redes sociais se multiplicam os comentários sobre o “trem da alegria” da
Assembleia Legislativa do RN, os meios de comunicação parecem ter feito um “pacto
do silêncio” sobre o assunto, que ameaça o status
quo da promíscua e notória relação existente, não de hoje, entre a mídia e
os governos. O “silêncio ensurdecedor” dá combustível àqueles que defendem a
tese de que o atual estado das relações políticas no RN não é mera culpa da “politicagem”,
entenda-se “dos políticos”, eximindo a sociedade de uma culpa que, em princípio
ela também tem.
Pois
bem, o processo que deu origem a publicização da denúncia que já fora feita em
2009, e que tomou novo fôlego com a postagem feita pelo Blog do Dinarte[1]·,
vem se arrastando desde novembro de 2002, data em que a Promotoria de Justiça
de Defesa do Patrimônio Público da Comarca de Natal, pertencente ao Ministério
Público Estadual (MPE), o mesmo que hoje trava uma batalha campal com a
governadora Rosalba Ciarlini (DEM) em torno de recursos para aquele órgão,
entrou com o Procedimento Administrativo n° 60/02, que depois se transformou em
inquérito civil para “(...) apurar a regularidade do acesso aos
cargos de provimento efetivo do quadro de pessoal da Assembleia Legislativa do
Estado do Rio Grande do Norte”[2].
Na época o presidente da Assembleia era o atual governador, Robinson Faria
(PSD). Portanto lá se vão DEZ ANOS dessa peleja, que bem poderia ter como referência
uma música de Zé Ramalho chamada de “A Peleja do Diabo Contra o Dono do Céu”.
De
novembro de 2002 a março de 2008, ou seja, quase SETE ANOS DEPOIS, o Ministério
Público Estadual conseguiu informações sobre os “fantasminhas”. É preciso que
façamos um esforço hercúleo para compreender como uma informação, para ser produzida,
leve sete anos, ou então vamos ter que acreditar que houve uma descarada
tentativa de impedir os trabalhos dos promotores, esperando, quem sabe,
esvaziar a denúncia por “inanição jurídica”, ou seja, o famoso “deixa prá lá”.
A
frascarice verificada na Assembleia Legislativa levou o MPE a afirmar, de forma
estarrecedora, que a posse dos “barnabés fantasmas” era algo comum entre 1990 e
2002 e que estes “fantasminhas” eram colocados à disposição da “casa do povo”
estadual e sorrateiramente eram elevados à condição de efetivos, sem qualquer
constrangimento ou pudor por parte da Mesa Diretora da Assembleia. Os vagões do
“trem da alegria” foram fartamente abastecidos durante doze anos.
Em
junho de 2008, a 1ª. Secretaria da Mesa da Assembleia Legislativa informou[3],
enfim, forneceu a origem dos “fantasminhas”, que iam desde os falidos e
privatizados BANDERN e BDRN, a órgãos da administração direta e indireta do
estado e dos municípios, passando pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) e até
da própria Assembleia Legislativa que eram cargos comissionados.
Em agosto de 2010, diante
das primeiras derrotas do MPE, frente aos juízes de primeiro grau do RN, que
alegavam estar prescrita a pretensão de anulação do provimento dos cargos, ou
seja, a ação do MPE perdera-se no tempo, o Movimento Articulado de Combate a
Corrupção (MACCO), tão conhecido quanto a cantina do “seu” Assis lá em Bodó,
entrou em campo para defender a ação do MPE[4].
Judiciário contra judiciário, o que é quase uma blasfêmia para a corporação.
Qualquer
cidadão que leia a peça do Ministério Público Estadual, se enojará certamente
com a forma de como os “politicanalhas” trataram o patrimônio público, com os
atos espúrios e indecentes, sem nenhum constrangimento e coberto sob o manto da
mais absoluta falta de vergonha e descompromisso com o erário público.
Como
uma recepcionista de um órgão estranho à Assembleia Legislativa, passa à
condição de assessora parlamentar de nível superior da mesma, sem concurso
algum? Os cabides de emprego, fartamente conhecidos e reconhecidos nas gestões
passadas, presentes e, infelizmente futuras, geraram esses “fantasmas”.
Visto
mais de perto, se verifica a origem dessa verdadeira orgia com o dinheiro
público. São 21 fantasmas oriundos do Banco do Estado do Rio Grande do Norte
(BANDERN)[5]
e 5 foram do Banco de Desenvolvimento do Rio Grande do Norte (BDRN), liquidado em
2005. Mas 46 não vieram de nenhum órgão extinto, falido ou liquidado. Vieram
das entranhas do setor público estadual e ai é que a esbórnia transparece.
Técnicos
de Nível Superior da Secretaria Estadual de Saúde, como é o caso do
ex-presidente da Assembleia Legislativa, Álvaro Dias. Professores, dentistas, médicos,
enfermeiros, assistente sociais, os chamados técnicos especializados “D” e auxiliares
de serviços gerais, compunham esse pequeno destacamento do “exército dos
fantasmas”, todos agraciados com o cargo de assessores parlamentares.
A administração
indireta também deu sua “contribuição”. De lá foram “agregados” a Assembleia
Legislativa 42 “fantasminhas”, vindos da autarquia famosa por sua competência e
moralidade, o DETRAN (sic); da DATANORTE; da CEASA; da FUNDAC; da FETAC,
conhecida por ser desconhecida; da sumida CDM; da COHAB; da famigerada FEBEM; da
Fundação Hospital Walfredo Gurgel; do IPE; EMPROTURN; CAERN; da privatizada
COSERN; da CDI e da pomposa (e inútil) CIMPARN[6].
Nove
“fantasmas” foram “doados” pelo incorruptível e imparcial Tribunal de Contas do
Estado (TCE) e 17 foram enquadrados pela Mesa da Assembleia Legislativa com
base no artigo 15 das Disposições Transitórias da Constituição do RN[7],
talvez como prêmio por ser um grupo de notório compromisso com a melhoria da
qualidade de serviço da Assembleia Legislativa. Acredite quem quiser.
Dois
servidores da Prefeitura Municipal de Natal e um da de Nísia Floresta, além de
um “fantasminha” oriundo da Companhia de serviços urbanos de Natal (URBANA),
também aquinhoados com esse “prêmio laboral”. E doze foram enquadrados
simplesmente porque trabalhavam na Assembleia Legislativa, como “cargos
comissionados”. Estavam no lugar certo e indicados pelas pessoas certas.
O
Ministério Público Estadual adjetivou os atos de enquadramento de “despudorado”,
um termo elegante para “sem-vergonhice explícita” e que estes atos criaram uma “casta
de privilegiados”, o que, aliás, nós vemos constantemente nas decadentes “colunas
sociais”, nos programas que festejam as “pessoas importantes e chiques” do
estado e que são bajuladas com salamaleques de vários blogs festeiros ou de
blogueiros festivos. Aliás, gostei do termo “mesquinha e tacanha cultura
patrimonialista do alto escalão político”, o que me faz recordar essa camarilha
posando para fotos, com sorrisos largos e abraços esfuziantes no “povão”,
enquanto os apunhala pelas costas.
A
publicação desses atos de enquadramento em “boletins internos”, sem serem
publicados no Diário Oficial do Estado, revela o mau-caratismo daqueles que os
nomearam e a assinatura do termo de culpa de um ato escuso e abjeto. É o que o
MPE chama de “atos simplesmente inexistentes” ou “secretos” na prática.
O
minucioso, e por isso mesmo árido e enfadonho, documento do MPE deve ser
estudado como uma peça ligada á Ciência Política, já que desnuda frontalmente a
estrutura de poder montada pelo estado para fabricar suas maiorias políticas e
eternizar sua dominação. Os fatos, agora demonstrados claramente, revelam o
apodrecimento das instituições representativas do RN, o que não é nenhuma
surpresa, já que há muito tempo a Assembleia exala um odor misto de mofo e
podridão, onde uma “classe política” discursa afagos entre si e se mostra
absolutamente descomprometida com os interesses da população em geral.
Veremos
como se desdobrará esse fato, mas o silêncio cúmplice dos meios de comunicação
do estado e dos blogueiros mais afoitos, já mostram que se a sociedade não
abrir os olhos, veremos os “fantasmas” rirem da nossa cara e, junto com os
cúmplices diplomados de representantes do povo, continuarem a festança.
[1] http://dinarteassuncao.wordpress.com/2013/01/21/o-trem-da-alegria-da-assembleia-legislativa/
[3]
Através do Ofício n° 075/2008, de 11 de junho de 2008.
[5]
Fundado em 1909 como Banco de Natal, foi, durante décadas, o banco do governo
estadual que financiava vários setores da economia. Deficitário devido às ações
dos seus gestores, foi fechado em setembro de 1990 e liquidado definitivamente
em 2008.
[6] Departamento
Estadual de Transito do RN(DETRAN-RN); Companhia de Processamento de Dados do
RN (DATANORTE); Central de Abastecimento do Rio Grande do Norte S/A (CEASA); Fundação
Estadual da Criança e do Adolescente (FUNDAC); Fundação Estadual do Trabalho e
Ação Comunitária (FETAC);Companhia de Desenvolvimento de Recursos Minerais do
RN (CDM); Companhia de Habitação Popular do RN (COHAB-RN); Fundação Estadual do
Bem Estar do Menor (FEBEM); Instituto de Previdência do Estado do RN (IPE); Companhia
de Desenvolvimento Industrial do RN (CDI) e Companhia de Implantação de Projetos
Agrários do RN
[7] É assegurado ao servidor público estadual, da administração
direta, autárquica e fundacional, com tempo igual ou superior a cinco (5) anos
de exercício que, na data da promulgação da Constituição, estiver à disposição,
por tempo igual ou superior a dois (2) anos de órgão diferente daquele de sua
lotação de origem, ainda que de outro Poder, o direito de optar pelo
enquadramento definitivo no
órgão que estiver servindo, em cargo ou emprego equivalente,
quanto à remuneração, e assemelhado, quanto às atribuições, desde que o faça no
prazo de trinta (30) dias.
Nenhum comentário:
Postar um comentário